Na mais escura das noites, com o bico do sapato, ele chutou uma pedra no caminho. A pedra voou.
Voou mesmo, hoje é uma estrela e ilumina como um farol aquela trilha, onde até brotou um pequeno rio, virou uma vereda.
Ele estragou o melhor sapato. — Nada é em vão, disse uma voz no seu coração.
Então ele voltou a caminhar por ali, e com tanta luz nunca mais tropeçou.
Uma vizinha até contou a ele que também andava por ali, e estranhava que, de repente, aquela estrada tinha se iluminado, intensamente. E que agora a percorria até descalça, molhando os pés nas águas cristalinas que ali passaram a correr. Sem temer as pedras. E que às vezes parava no meio da caminhada só para olhar o intenso brilho de uma estrela que se destacava no céu daquele caminho.
Ela, a vizinha, quase foi às lágrimas ao revelar que ali passou a ser o único lugar em que ela ouvia os pássaros cantar dentro da noite.
O dono do sapato estragado entendeu que nenhum sapato teria mais valor do que aquela nova estrada.
São 23:30 desta sexta-feira, dia 25 de outubro de 2019, vou tirar os meus sapatos para dormir, e lembro da minha neta Isabel que partiu tão cedo, da dor da ausência dela, que não cura. Mas vejo na cabeceira do meu criado mudo a foto da minha outra netinha, Cecília, sorrindo para mim, junto de toda a família que ficou. A dor da saudades se veste, com emoção inigualável, de um conforto do mais puro amor e gratidão.
Boa noite a todos.